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“Enquanto Deus nos dá vida neste mundo, sempre há lugar para a conversão e para recorrer à sua misericórdia”, afirma arcebispo de São Paulo

A aproximação do fim do ano litúrgico nos coloca diante da perspectiva do fim de nossa peregrinação terrestre, do fim da história e do grande encontro para o qual nos encaminhamos: encontro com Cristo Rei e Senhor do Universo, Senhor de nossas vidas. E nos coloca diante do julgamento de Deus sobre nós e sobre o mundo.

Falar do julgamento de Deus não é fácil, num contexto cultural em que o homem proclama sua autossuficiência e rejeita a ideia de dar contas a alguém sobre seus atos e sua vida. No entanto, é ilusão pensar assim, pois, até para conviver responsavelmente neste mundo, devemos prestar contas aos outros e à sociedade. Ninguém deve se achar senhor absoluto de suas decisões e ações, acima do bem e do mal.

Nossa fé cristã, firmemente enraizada na Palavra de Deus, nos diz que devemos prestar contas a Deus de nossas ações e nossas vidas. Na nossa Profissão de Fé (Creio em Deus Pai…), afirmamos, a respeito de Jesus Cristo ressuscitado e glorificado no céu: “e de novo há de vir para julgar os vivos e os mortos”. Os vivos já estão sob o julgamento de Deus durante esta vida e têm a possibilidade de se converter e recorrer à misericórdia e ao seu perdão. E os mortos passarão pelo julgamento decisivo de Deus e de Cristo glorioso, para receber a sentença de prêmio ou de condenação.

Já os profetas do Antigo Testamento anunciavam o julgamento de Deus (cf. Ml 3,19; Jl 3-4). João Batista chamava todos à conversão para escapar do julgamento condenatório (cf. Mt 3,7-12). Em vários momentos de sua pregação, Jesus aludiu à prestação de contas que cada um deve dar a Deus sobre sua vida e suas ações, afirmando que serão revelados os segredos dos corações (cf. Lc 12; Jo 3, 20-21) e cada um receberá de Deus o prêmio ou o castigo pela sua conduta.

No Evangelho de São Mateus, Jesus revela que o julgamento final chamará em causa, sobretudo, o modo como tratamos as pessoas, especialmente os pobres e necessitados de todo tipo. O Juiz glorioso vai nos dizer que tudo aquilo que fizemos aos outros é como feito a Ele próprio, no bem e no mal. Quem tiver feito o bem aos pobres, famintos, doentes, encarcerados, desabrigados e todo tipo de pessoas em situação de sofrimento, angústia e necessidade, será bem acolhido na felicidade eterna. Eles ouvirão esta afirmação dos lábios do supremo Juiz: “Foi a mim que o fizestes, cada vez que o fizestes a um desses meus irmãos mais pequeninos”.

E aqueles que não tiveram essa atitude de compaixão e proximidade das pessoas em situação de carência e sofrimento, mas, em vez disso, lhes fecharam o coração, ouvirão do mesmo supremo Juiz a sentença terrível: “Ide para longe de mim, para o fogo eterno. Porque, ao deixardes de socorrer meus irmãos mais pequeninos, foi a mim que deixastes de socorrer!” (cf. Mt 25). O mal que praticamos tem sempre repercussões negativas sobre o próximo, mesmo quando não nos apercebemos disso imediatamente. Por isso, o julgamento final terá sempre em conta nosso amor a Deus e ao próximo, ou a falta de amor ao próximo. Jesus, de fato, resumiu os mandamentos da Lei de Deus no amor a Deus e ao próximo.

A ideia da prestação de contas da vida a Deus e do julgamento final pode assustar um pouco. Mas saber e aceitar isso é salutar para que vivamos honesta e dignamente neste mundo. Oxalá lembrássemos mais disso, sobretudo diante das grandes tentações e das ocasiões de pecado! Muita coisa no convívio social e na conduta pessoal poderia ser diferente se cada um lembrasse que deve prestar contas a Deus sobre sua vida e suas ações. Devem temer o julgamento de Deus aqueles que se fecham ao amor de Deus e praticam maldades de todo tipo contra o próximo e são insensíveis diante das dores, sofrimentos e angústias do próximo. Enquanto Deus nos dá vida neste mundo, sempre há lugar para a conversão e para recorrer à sua misericórdia, para não ouvir do supremo Juiz estas palavras terríveis: “Ide para longe de mim!”

Fonte: Canção Nova

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